A minha sobrinha Thaís possui um dom maravilhoso: escrever bem, conseguir passar em palavras sentimentos e isso é difícil. Poucos escritores conseguem isso. Thaís, você não descobriu ainda, mas será escritora. Amo vc, continue escrevendo linda!
Abaixo um texto que tirei do blog dela, concordo em número e grau. Parabéns!
SER MULHER
Acabo de chegar de mais uma noite insone. Como quase todos os dias esperava dormir cedo, acordar cedo, enfim, ter uma vida minimamente mais “normal”. No entanto pra variar cá estou, ainda acordada, inquieta e já sabendo que só vou acordar lá por meio-dia e olhe lá. Meus horários não são lá muito coerentes com o mundo. Mas enfim, isso não importa agora.
Voltei agorinha de uma conversa muito interessante. Na verdade de um desabafo e pra minha imensa surpresa o desabafo foi meu e de iniciativa minha. (nunca ou quase nunca isso acontece – nem desabafar muito menos sendo eu a tomar iniciativa).
Desde sei lá quando me agarra pelos pés essas questões acerca da mulher, de ser mulher. Cá com meus botões e observações tenho pensado que do instante que descobrem seu sexo sua vida já é praticamente determinada. Ou seja, ser mulher ou homem determina toda sua postura no mundo. Sem muito abranger para não me perder nas divagações falarei só de ser mulher.
Sendo mulher provavelmente as roupinhas, acessórios e blábláblá serão cor-de-rosa com variações nos tons e um branquinho pra contrastar. Já se espera um casamento e maternidade. Já se espera polidez. Fofura. Espera. Fragilidade. Delicadeza e por aí vai. Meu sexo quase me define por inteira, quase define toda a minha história. Esse assunto é muito grande, tem infinitas coisas para serem faladas, pensadas, repensadas, discutidas, etc. e como não consigo e nem posso abranger tamanho infinito falarei das coisas que mais tem me tirado o sossego.
Esteticamente o que se espera de uma mulher? Linda é sinônimo de que? As respostas na minha cabeça são bem parecidas – Magra, depilada, cabelo no lugar, salto alto, etc. Enfim, tem inúmeras coisas que teoricamente deixam uma mulher mais atraente. Me parece tão cruel ter que se firmar num padrão qualquer para ter um lugarzinho no mundo. Mais cruel ainda é que a procura por estar nesses padrões sempre ou quase sempre é pelo outro. Não é por si. Nunca vi uma mulher querer ser magra porque realmente quer ser magra, até hoje só vejo mulheres se maltratando porque os homens preferem que elas sejam magras/gostosas. Porque só assim conseguirão arranjar um marido ou qualquer coisa que o valha. Mas também já ouvi “não ligo de ser gorda, afinal, existem homens que gostam de mulheres gordas” – Quase desfaleci ao ouvir essas palavras pulando em meus ouvidos. Olhando para mim e olhando a minha volta é só isso que vejo, mulheres que vivem pelos e para os outros. Sabe, é como se não pudesse ser diferente. Nasceu mulher tem que usar salto, cuidar do corpo, se depilar, casar, ser mãe, transar só se estiver namorando e olhe lá porque do contrário as pessoas vão falar e se eu ficar aqui pensando mais alguns minutos vou encontrar mais umas trilhões de exigências para o ser mulher (como também existe para o ser homem).
E me vem na cabeça o prazer. Uma vez uma amiga me perguntou se mulher também gozava, sim, as mulheres gozam e podem gozar várias vezes em uma única noite. Em uma única transa. Eu demorei muito pra descobrir isso e ainda assim porque sou muito curiosa e inquieta. E ainda assim tenho uma série de amarras que estou dia a dia repensando e trabalhando em mim para quebrá-las. Sexo só é naturalizado desde sempre para os homens, ainda se é quase proibido pra uma mulher transar e principalmente somente pela única e pura vontade de transar. Sabe essa coisa de sexo com amor e blábláblá, pois é. Nós estamos sempre à espera. Temos que nos arrumar, nos cuidar minuciosamente para esperar o homem que nos irá amar, cuidar e proteger. Parece que estou falando absurdos afinal estamos aí no sec. XXI, tudo muito mudado e não sei o que. Mentira. Essas relações estão aí é só observar. Essas mulheres a espera estão aí é só observar. Óbvio que muitas coisas mudaram sim, mas o machismo está em tantas sutilezas que é quase imperceptível.
O que tem a ver questões estéticas com sexo? Na minha cabeça a coisa toda está intimamente ligada. Sexo pra mim é troca, liberdade, movimento. Acho um saco homem que tenta impressionar, que quer ser machão e principalmente que tem pressa. Existe sim mesmo que escondida uma preocupação com o que o outro vai pensar do seu corpo no momento do sexo. Martela a preocupação de que o outro não vai sentir tesão se você não estiver dentro desses padrões estéticos. E sexo é muito para além disso. Alias tesão deveria ser independente de questões estéticas. Sendo mulher as cobranças se multiplicam, pois além de ter que quebrar as amarras da questão sexual que por si só já é um tabu para nós, ainda temos que quebrar as amarras da cobrança por uma estética socialmente aceitável. Ainda é comum mulheres que não se masturbam, que não gozam, que não sentem prazer algum. Alias é comum mulher dar prazer somente. Tão comum quanto e tão cruel quanto é a resignação. Não saber e não buscar outras perspectivas e acabar sempre nesse mesmo papel (na falta de um termo melhor) de quem espera, de quem da prazer e só. Ou então se resignar que não tem problema em ser gorda, por exemplo, porque existe homem que gosta de mulher assim. Me irrita profundamente aquele papinho de que fulana é linda por dentro ou então aquele negócio de ter que gostar de você do jeito que é. O lance é que não existe repensamento. O meu bem-estar está sempre no outro. Só estarei bem e tranqüila com meu corpo se meu namorado ou marido estiver bem e tranqüilo. Não estou trabalhando isso em mim e comigo e sim transferindo a minha insegurança para outrem.
Eu não sou diferenciada, emancipada nem nada dessas coisas. Tudo que estou externando aqui é a minha indignação acerca dessas questões e todas essas palavras fazem parte do meu repensamento, da minha (des)construção. Me recuso a resignação. Me recuso a esperar. Mas confesso, é extremamente doloroso, está tudo tão arraigado, tão impregnado. Chorei até não poder mais no tal desabado dessa madrugada. Chorei porque dolorosamente quero minha prática coerente com tudo que eu penso, repenso e falo todos os dias. Chorei porque é extremamente difícil ser coerente e é inevitável escorregar as vezes. De repente me dou conta da besteira e choro, choro, penso e repenso tudo novamente, me desfaço e refaço milhões de vezes, são mudanças que se fazem a longo prazo e não de um dia para o outro.
Eu sou péssima para terminar meus textos, portanto, por enquanto em relação a esse assunto disse tudo que queria dizer. E é isso. Findo minha indignação por aqui.
conheçam o blog: http://libelulante.blogspot.com/